Era dia de sábado, quando um austero ancião de testa franzida e roupa surrada passava pela estrada que leva a Jerusalém…
Mariana Morazzani Arráiz
Há perto de dois mil anos, numa manhã clara e aprazível, o sol espargia seus raios benfazejos sobre a região de Nazaré, na Galiléia.
Algumas crianças brincavam num campo à margem do caminho que leva a Jerusalém. No meio da alegre e animada reunião destacava-se a figura atraente e luminosa de um Menino Divino: Jesus, o filho de José, o carpinteiro, e de Maria, o Salvador predito por Zacarias, o esperado por mais de quatro mil anos pelos patriarcas e profetas de Israel. Estava Ele ali também a brincar e a distrair-se com os companheiros entre risos e exclamações de inocente e límpida felicidade.
Formavam eles pequenos passarinhos com a argila do caminho, e os criativos dedinhos infantis modelavam à vontade a cauda, as asas, o bico e os olhos das avezinhas imaginadas. Pareciam voar aqueles pássaros de barro enquanto suas asinhas estendidas secavam-se ao vento quente de verão!
Ora, era dia de sábado. Um austero ancião de testa franzida e roupa surrada passou, então, pela estrada que leva a Jerusalém e, ao deparar-se com a ruidosa assembléia que despreocupadamente continuava seus “trabalhos” de modelagem, gritou com voz dura:
– Meninos, hoje não é permitido laborar com as mãos!
A estupefação estampou-se nas cândidas fisionomias dos “escultores”…
Sem aguardar resposta, o rígido seguidor da lei mosaica, cheio de azedume, levantou ameaçadoramente um rústico bastão e dispunha-se a transformar em cacos as graciosas figurinhas…
Então Jesus, o filho de Maria, ergueu- se e bateu palmas sobre as aves de barro. Oh, comovedor milagre! – elas cobraram vida e cor, levantaram leve e apressado vôo e perderam-se no azul do firmamento.
* * *
Depois daquele feliz dia, todas as andorinhas – pois é delas que narramos a história -, fiéis à lembrança de sua encantadora origem, protegidas e abençoadas por Jesus, constroem seus ninhos de argila sob os telhados das casas.
São elas símbolo de bênção e prosperidade nos lugares onde habitam.
* * *
Quando Jesus exangue subiu ao alto do Calvário no trágico dia de Sexta- Feira Santa, em que pavorosas trevas tomavam conta do universo, as humildes e gratas andorinhas, em bando reverente e compassivo, vieram arrancar com seus delicados bicos os espinhos que perlavam de sangue a fronte adorável e sagrada do Mestre, o arrebatador Menino do caminho de Nazaré que num sublime e divino impulso, cheio de alegria, cerca de trinta anos atrás as havia criado…
E, a partir da morte de Jesus, o Criador amado, a andorinha, peregrina alada, numa suprema homenagem de amor e ternura, traja com nobre e distinta ufania seu escuro manto de luto…
(Revista Arautos do Evangelho, Dez/2005, n. 48, p. 47)
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