Beleza e mistério estão profundamente relacionados na liturgia. Quando esta é realizada com amor a Deus e amor à perfeição, manifesta-se nos fiéis a ação do Espírito Santo que os “fascina e enleva”, que faz com que aqueles que a assistem não vejam a função litúrgica como um mero ato de domingo, mas voem para essa fonte divina que é o Amor. A liturgia celebrada com amor deixa perceber esse amor aos fiéis. Não é uma mera repetição mecânica de atos, mas cada movimento, cada palavra, cada cântico faz nossas almas saírem do cotidiano para nos esforçamos em amar, desejar ir para o Céu e aspirar à perfeição.

A beleza da liturgia da Igreja Católica é toda cristológica, e por meio dela se contempla e se adora Jesus Cristo sofredor, nos mistérios da Via Sacra, e também a alegria pascal da Ressurreição. Mas não se pode esquecer de que onde está a cabeça, aí está também o corpo. A liturgia se refere, portanto, ao que Santo Agostinho chamou Christus totus, Cristo total, cabeça enquanto objeto de nossa adoração, e corpo enquanto assembleia dos fiéis, enquanto Igreja unida a Ele, e que o adora[1]. A catolicidade, isto é, a universalidade da Igreja desprende-se desta amplíssima unidade chamada Christus totus, a qual não caberia nas limitações da mente humana se o Espírito Santo não atuasse por meio da Liturgia fazendo transluzir através dela esta figura de Jesus Cristo. A Igreja tem, pois, a missão de configurar essa prodigiosa unidade de Cristo.

Da perspectiva profética, a Liturgia, como está ordenada”, contempla, à luz de toda a Sagrada Escritura, quaisquer que sejam as situações humanas, a partir do olhar de Deus. Na Sagrada Liturgia pode-se haurir a orientação divina para todos os homens, de todos os tempos[2]. Através dela, Cristo e o Espírito Santo, a um tempo, falam à Igreja enquanto assembleia de fiéis, e falam a cada fiel individualmente, em suas aspirações e necessidades, por meio daquela mesma “linguagem” empregada em Pentecostes.

Os Apóstolos e os Santos Padres, sob a inspiração do Espírito Santo, souberam elaborar uma linguagem apropriada para falar à civilização greco-romana globalizada do seu tempo. Mais tarde a Igreja enriqueceu sua mensagem para falar aos bárbaros, povos muito diversos quanto à origem, mas também eles, a seu modo, globalizados, em toda a extensão das ruínas do Império Romano. À Idade Média a Igreja falou, eloquentemente, por meio do espírito beneditino dos grandes Abades de Cluny, depois pela pregação e exemplos das Ordens Mendicantes, e mais tarde, com os descobrimentos, estendeu sua ação benfazeja por toda a América, África, Índia e Japão.

Essa Liturgia da Igreja, assim desenvolvida ao longo dos séculos, foi “a fonte primária e indispensável do verdadeiro espírito cristão”[3]. Tal como seja o espírito litúrgico com que o povo assista aos divinos mistérios, e a atitude de iluminada devoção com que siga o desenvolvimento da ação sacrossanta, tal será também seu grau de vida espiritual. A Fé e a Moralidade de um povo estão em relação direta com sua vida litúrgica – A Santa Missa, o Sacrifício do Altar, é um mandamento do próprio Cristo aos Apóstolos e os discípulos; por essa razão, desde o início do Cristianismo, nas comunidades da Palestina e em todos os lugares onde se estabeleceram os primeiros cristãos, era celebrada a Eucaristia.

Aqueles que nos primeiros tempos do Cristianismo participavam das celebrações para os catecúmenos, muitos vezes clandestinas, ficavam surpreendidos com a beleza, o respeito e a elevação do culto, o que era para eles grande estímulo para pedir o Batismo.

A Liturgia é mais que tudo uma comunicação de Deus com os homens. Nela a beleza atinge um auge em que Deus se faz eminentemente presente

Deus se dá a conhecer através do criado, se revela assim ao homem e ajuda a enriquecer seus conceitos. Não obstante, sem a Fé, não alcança apronfundar o divino, nem, sem sua graça, se alcança um conceito de Deus e das realidades divinas. Deus existe. Como conhecê-lo? A Fé é a linguagem usada por Deus para que nos comuniquemos com Ele, e a pedagogia divina se efetua mediante a graça.

O homem, abalado por toda a decadência moral e espiritual, é conduzido a uma decisão perante tal magnificência. Se for fiel a esta “ocasião próxima de graça”, resultará numa conversão, pela qual entrará numa íntima relação com seu Criador, marcando-o para sempre.


[1] Cf. AGOSTINHO, Santo. Comentário ao Evangelho de São João. Coimbra: Casa do Castelo. 1950. s.p.  Vol. III.

[2] Cf. RIGHETTI, Mario. Storia Liturgica. IIª edizione anastática: settembre 2005. Milano: Àncora, 2005. s.p.

[3] COELHO, D. Antonio, O. S. B. Braga: Mosteiro de Singeverga – Livraria Litúrgica, 1941. s.p. 2 Vol.